segunda-feira

O caso Battisti e a opinião de Francisco Rezek

Para justificar o refúgio concedido ao terrorista italiano Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua em seu país por quatro assassinatos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alegou ter se baseado em um parecer da Advocacia Geral da União (AGU) que recomendava a manutenção do criminoso no Brasil. No texto de 65 páginas assinado pelo consultor da União Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, a AGU argumenta que, em casos de extradição, cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF) apenas “examinar a legalidade e a procedência do pedido”. Ou seja, a mais alta corte do país funcionaria apenas como órgão consultivo do presidente da República, que deve decidir sobre o assunto. Em novembro, o STF havia autorizado a extradição do terrorista, mas deixou para Lula a palavra final sobre o imbróglio. Para o advogado Francisco Rezek, especialista em Direito Internacional e ex-juiz do Tribunal Internacional de Justiça das Nações Unidas (Corte de Haia), ao ir contra a decisão do STF, Lula descumpriu os preceitos jurídicos da diplomacia internacional.


Rezek, que já foi chanceler e também ministro do STF, explica que a palavra final só cabe quando não há um acordo de extradição assinado com o país de origem de quem está sendo julgado. Em 1989, Itália e Brasil assinaram um Tratado de Extradição em que se comprometem a devolver um ao outro “as pessoas que se encontrem em seu território e que sejam procuradas pelas autoridades judiciais da parte requerente”. Em seu parecer, a AGU alega que, segundo o modelo extradicional da Bélgica seguido pelo Brasil, se o Supremo decidir manter no país o estrangeiro julgado, o presidente não pode autorizar sua extradição. Caso a corte aprove a extradição, porém, o presidente tem a prerrogativa de seguir a decisão dos ministros ou não. Isso é possível desde que sejam respeitados os pactos internacionais assinados pelo Brasil.

O especialista defende que a AGU levou o presidente Lula a incorrer em um “erro jurídico clamoroso” ao descumprir um acordo internacional. “Ainda que não houvesse esse tratado, o presidente ir contra a decisão do STF seria uma ruptura com nossa tradição diplomática. Mas quando há tratado é uma afronta ao princípio mais básico de direito internacional, um ato ilícito”, considera o especialista.

Francisco Rezek questiona também o argumento citado em entrevistas anteriores do presidente Lula de que ele era soberano para tomar uma decisão que iria contra uma definição da justiça italiana. “Parece que nosso presidente não aprendeu em oito anos o que é soberania. Ela não autoriza nenhum país a expropriar um país alheio. O verdadeiro gesto soberano foi feito quando o Brasil firmou um tratado com a Itália e isso deve ser respeitado”, pondera.

Perseguição - Na nota divulgada pela AGU, a justificativa da extradição refere-se a um item do tratado em que é permitida a devolução do julgado ao país de origem no caso de ele estar sujeito a “atos de perseguição e discriminação” ou correr o risco de ter sua situação agravada por algum motivo. O ex-juiz da Corte de Haia critica o ponto de vista. “O Supremo é quem define se há crime político ou comum, se há perseguição ou não ou se o julgamento será feito em um tribunal de exceção”, comenta. O STF examinou exaustivamente esse caso e o discutiu em um dos debates mais longos de sua história. Logo, a Itália tem todas as razões do mundo para estar subindo pelas paredes”.

Rezek critica ainda outro argumento da AGU, o de que uma pena de 30 anos de prisão a Battisti, que já passa dos 50 anos de idade, seria semelhante a prisão perpétua. “Esse é um tipo de delírio em que nunca se entrou antes. O Brasil já extraditou septuagenários e não deixou de fazê-lo por causa do tamanho da pena”, afirma. Sobre a alegação de que a pressão da opinião pública sobre o governo italiano poderia agravar a punição ao terrorista, Rezek é claro: “A pressão da imprensa e da população é comum, aconteceu com a extradição de todos os nazistas e isso não interferiu. O que interfere na decisão do Supremo é se o tribunal que vai julgar o extraditado é idôneo e confiável, o que é o caso”.

O ex-juiz lembra ainda que a Itália poderá recorrer da decisão brasileira a cortes internacionais. “Todo país vítima de um ilícito internacional tem esse direito e ainda pode vir a assumir represálias que manifestem seu rancor”, destaca Franciso Rezek.

2 comentários:

Anônimo disse...

Antes do ex ministro dar sua opinião já dava para imaginar sua opinião. Pelo seu histórico político. Mas mesmo assim ele deixou escapar seu rancor com a frase "Parece que nosso presidente não aprendeu em oito anos o que é soberania." E lembremos que foi ele o presidente do STE na eleição do Collor. E em seguida Ministro das Relações Exteriores do mesmo Collor. Um fato muito estranho. Onde deixa dúvida a sua imparcialidade.

Anônimo disse...

Inexiste no Brasil pessoa mais autorizada no assunto (extradicional)que o renomado magistrado Francisco Rezek. Para Lula recomendo a leitura da obra Direito Internacional Público da lavra do professor Rezek. Assim ele aprenderá o que é SOBERANIA em apenas 08 minutos.